Onde “gambararei”? Pode ser no Cais ou no Páteo e, no meu caso, foi no Páteo (Bagatela), a meio caminho entre o Marquês de Pombal e as Amoreiras, em Lisboa. Vamos recuemos ao início do texto – “gambararei”? É um neologismo saído da criatividade dos quatro sócios destes Gambar, uma fusão entre gambas e bar.
Um bar de gambas, portanto? Mais do que isso, mas, sim, as gambas são a estrela desta companhia gerida por Tiago Drummond Borges, Filipe Melo, Giscard Muller e Dimas Cavallo. É o primeiro que partilha como, num dia ao almoço, decidiu avançar com a compra deste espaço. Um foodie assumido, muito embora tenha feito carreira no mundo da tecnologia, sentia-se sempre algum desconsolo quando lhe apresentavam gambas cozidas. Via-as sem graça e já não o convenciam. Mas, Dimas Cavallo, o chef ítalo-brasileiro que assume a cozinha do Gambar, não o deixou desistir deste pitéu, mostrando-lhe que há mais gambas para lá das cozidas.
Mas, já lá vamos. Sentemo-nos à mesa e comecemos pelo couvert. Enquanto apreciamos um branco de Colares, “Baía e Enseadas – Cerceal”, é tempo de provar a manteiga com nozes e sultanas, o que lhe confere um inesperado toque adocicado, e o queijo feta com malagueta e pimentos vermelhos, que contrasta pelas notas picantes, mais intensas.
As gambas dão-se a conhecer logo a seguir, numa reinterpretação da tiborna, que tradicionalmente se faz com bacalhau. O pão é de Mafra e sobre a fatia, além das gambas (que passaram pelo carvão), bacon, presunto e maionese. Uma proposta muito gulosa, há que dizê-lo.
E eis que chegam as verdadeiras “gambas à Gambar”. São – conta Tiago Drummond – mais próximas das convencionais, mas, ainda assim, diferentes – grelhas com molho de vinho branco, limão, manteiga e alho, estão no ponto e o molho é um convite a mergulhar o pão. A acompanhar, um Alvarinho alentejano, “Assembleia”, de 2018.
O mesmo vinho fez companhia ao polvo do chef, mais uma reinterpretação de um prato típico português. Chega à mesa um tentáculo, em polme de ervas e cerveja, sobre puré de batata com queijo e molho de tomate especial. As batatas mantiveram-se clássicas, a murro. E o que dizer do polvo? Tenro como se quer e nem sempre se encontra.
O chef Dimas Cavallo é um apaixonado por bacalhau, pelo que o fiel amigo não podia falar no menu. A posta é grelhada, em cama de grelos salteados, coberta com puré de azeitonas pretas. Uma boa combinação, com a posta a lascar e o sal no ponto, mas talvez uma tapenade demasiado intensa… Para estes sabores mais fortes a harmonização fez-se com um Douro, Quinta do Carvalhido, uma escolha – tal como as demais – do sócio Giscard Muller.
Este tinto fez igualmente companhia ao Bife quase à portuguesa, que chegou à mesa num corte da vazia, batatas fritas às rodelas e ovo estrelado. E com molho, claro, mais uma tentação. A finalizar, toucinho do céu, mas com bola de gelado. Uma variação que pode ser um “sacrilégio”, mas que fechou muito bem esta refeição.
Este é um Gambar amplo, de decoração sóbria, luminoso. E a mais recente entrada numa família que, além do Gambar no Cais, inclui a hamburgueria Blue Jean, em Paço d’Arcos, onde se pode dizer que tudo começou.
E, agora que já conhece o verbo, onde “gambarará”?